Inquietações e soluções ao financiamento do agronegócio brasileiro

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A safra brasileira 2021/2022 entrará para a história como uma das mais instáveis, em termos de clima, nas últimas décadas. Além das oscilações de temperatura, chuvas torrenciais e até geadas, houve significativo prejuízo ocasionado por prolongada seca comprometendo, especialmente, localidades produtoras de destaque nacional. Com a virada do ano, cresceu a esperança de modificação do cenário. Novamente, porém, nos deparamos com intempéries que afetam a oferta e os preços dos produtos de origem agropecuária.

Em 2022, a seca começou ainda mais cedo e de maneira localizada, atingindo as regiões de Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e o sul de Mato Grosso do Sul. As perdas são enormes, especialmente ao produtor rural que adquiriu insumos – sementes, defensivos, fertilizantes etc. – a preço elevado. E esse é só o prejuízo direto. O resultado, vale dizer, afeta toda a cadeia. O aumento do preço dos grãos impacta o produtor de ração animal o que, por seu turno, reflete no preço do ovo, do leite e das carnes. Aliado à falta de chuvas, a intensa onda de frio que provocou queda acentuada de temperaturas em meados de maio assustou cafeicultores brasileiro ainda assombrados pelo último ano.

A retomada da economia mundial pós-crise pandêmica, especialmente puxada pela China, que impulsionou o preço das commodities, trouxe expectativas positivas. O movimento ocasionado deveria ser capaz de diminuir a cotação do câmbio, o que aumentaria o poder de compra de materiais estrangeiros. Por uma série de fatores, porém, o dólar se tornou mais caro: o custo das matérias-primas subiu (cotadas em dólar) e avançou, ainda mais, na conversão para reais. Em parte, isso explica o rápido avanço da inflação no país, o que também diminui a margem de lucro do produtor rural e afeta preços finais ao consumidor. Cerca de um quarto dos insumos utilizados pela indústria no Brasil, aqui inserida a agroindústria, vem de fora. A alta da moeda estrangeira, portanto, quase anula os efeitos positivos das exportações.

Há quem pense, porém, que a elevação dos preços das commodities foi suficiente para criar maiores margens aos produtores rurais, o que pode ser uma realidade para alguns, mas não expressa o resultado da maioria do setor. As secas e as altas de preços geraram menos material para exportação, menos material para o consumo interno e, aliado à alta do dólar, margens mais apertadas.

Ao cenário traçado somamos o aumento do preço dos insumos agrícolas. Se em 2021 já notávamos escalada considerável no preço dos fertilizantes, por exemplo, o embate entre Ucrânia e Rússia elevou a inquietação nacional. Restrições à exportação com a consequente diminuição da oferta de produtos no mercado, bem como, os altos valores de matérias-primas, gás natural e carvão tornam a teia de problemas ainda mais emaranhada.

Além disso, enfrentamos preocupações quanto ao custeio das atividades rurais que, com riscos elevados, precisam de crédito de médio e longo prazo. Recursos públicos, por seu turno, há anos são apontados como insuficientes. O maior sinal de alerta veio, porém, quando apenas meses após o lançamento do Plano Safra 2021/2022 noticiamos os primeiros sinais de esgotamento do crédito rural.

A alta de juros no país é, ainda, um agregador à situação complexa, capaz de consumir o orçamento da equalização do governo de maneira muito veloz. As contratações de crédito foram suspensas em fevereiro de 2022, com lapso de quatro meses de contratações congeladas.

Apesar de todas as adversidades, o crescimento do agronegócio brasileiro é nítido. A resposta positiva, seja em tempos de pandemia, seja em tempos de crises climáticas é inegável. Pari passu, é indústria a céu aberto que sofre, como nenhuma outra, com a perecibilidade da produção e adversidades climáticas. Apesar do alto valor gerado e circulado, a crescente do preço dos insumos, a variação do dólar e a perda de safra elevam os custos e os prejuízos futuros ao produtor, à cadeia e ao consumidor.

Precisamos, aqui, nos adequar com o ingresso de crédito privado para financiamento da produção. O produtor, resiliente e persistente, tem se desenvolvido e se profissionalizado. Gestão rural, planejamento patrimonial e desenvolvimento tecnológico são termos cada vez mais presentes no linguajar do setor. Há poucos anos atrás, porém, eram inimagináveis.

O setor passa e deve continuar passando, por modernizações, assim como a sociedade, como um todo. Podemos e devemos buscar mecanismos de profissionalização e de maior inserção nacional em cadeias de valor globais, sem que isso reflita em nosso consumo interno.

As expectativas com o Plano Safra são sempre importantes, mas não podem ser limitantes. Precisamos trabalhar, em paralelo, com mecanismos que sejam capazes de oferecer uma estabilidade financeira ao produtor, como os Fundos de Investimento nas Cadeias Agroindustriais (Fiagro), que têm demonstrado sua expressão no setor e têm sido observados como uma solução à alavancagem de crédito, com reorganização do endividamento do produtor rural e entrada de novos investidores no agronegócio nacional.

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